Arte na comunidade
A primeira galeria fotográfica localizada em uma favela respeita as construções ao seu redor e conversa com seu entorno.
Por Marcela Millan
Recluso no final do Leme, bairro da orla carioca, o Morro da Babilônia abriga uma favela homônima onde as construções despontam em meio à mata. Quem olha de longe não imagina que ali, também, foi sede da Galeria 1500 Babilônia, comandada pelo fotógrafo Alex Bueno, que desejava encontrar um lugar para transferir seu estabelecimento do bairro nova-iorquino de Chelsea para o Rio de Janeiro. O espaço cultural já fechou as suas portas, mas mantém o status de primeiro espaço do gênero em uma favela. A escolha do lugar não foi por acaso: a melhor amiga da mãe de Alex era casada com o diretor de cinema francês Marcel Camus, que dirigiu o clássico “Orfeu Negro” naquele lugar, em 1959; ele cresceu ouvindo as histórias daquela mítica filmagem. “Alex encontrou as ruínas de uma casa inacabada no alto do morro e decidiu construir ali sua sede carioca”, explicam Pedro Évora e Pedro Rivera, titulares do escritório Rua Arquitetos, que assinam o projeto pioneiro.
[caption id="attachment_7434" align="aligncenter" width="800"] Abrigada no Morro da Babilônia, a Galeria 1500, com uma geometria irregular que segue a linguagem e respeita as construções da comunidade, conversando com seu entorno. O projeto aproveitou-se do esqueleto de uma casa abandonada, reformando a estrutura de concreto armado e adicionando uma laje, para abrigar um terceiro pavimento.[/caption]
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Partindo de uma escada pré-existente, o volume foi envolto com a circulação externa, fechada com brises verticais de maçaranduba, fixados na laje, do tipo “perna de três”. Graças a essa solução, foi dispensado o guarda-corpo, além de propiciar luz e ventilação.[/caption]
A casa originalmente apresentava um cômodo no térreo, erguido diretamente sobre a rocha, e um segundo pavimento com paredes bastante deterioradas, erguidas pela metade, e que provavelmente delimitariam o que seria uma sala e quartos. “Quando visitamos o local, já na perspectiva de implantar ali a galeria e seu escritório, tivemos a percepção de que o projeto deveria se valer da construção existente, suas estruturas sólidas, sua laje e seus materiais”, discorre a dupla, que respeitou o estilo das moradias ao redor, para que a galeria conversasse de forma natural com a estética do morro.
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Uma das dificuldades foi levar os materiais de construção ladeira acima. Assim, a obra levou dois anos para ser concluída, resultando em uma casa de 230 m². No corte, a casa acompanha a inclinação topográfica. No térreo, a área de serviços; no primeiro andar, a expositiva, e no segundo, a laje com escritório e terraço.[/caption]
Partindo de uma escada pré-existente, o arquitetos envolveram o edifício com a circulação de acesso, fechada com brises. O térreo foi destinado às áreas de apoio, enquanto no primeiro pavimento as paredes degradadas foram removidas para dar lugar à sala de exposições, com teto em laje aparente, criando um ambiente sóbrio. Ali, as luminárias em fita foram alinhadas às faces da parede – para reafirmar a geometria da construção.
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No primeiro andar, na área de exposições, uma abertura zenital permite a entrada controlada de luz natural, assim como a conexão visual entre os pavimentos. A planta-baixa mostra um único e amplo espaço com 43 m², no qual as paredes originais foram derrubadas. A circulação é externa, pela escadaria. No teto em laje aparente, as luminárias em fita seguem as mesmas linhas das paredes, reforçando sua geometria irregular.[/caption]
Sobre a nova laje de teto da galeria, feita com vigas de concreto invertidas, foi construído o deck do terraço e um volume em projeção, para abrigar o escritório. Aqui, uma esquadria de vidro e peroba servia como moldura para a vista – de um lado, a mata; do outro, a orla marítima.
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Os elementos arquitetônicos foram pensados para a perfeita iluminação natural – mas tudo devidamente controlado –, seja através dos brises, ou da janela do último andar, no volume projetado sobre a paisagem e que recebe o escritório de 22 m².[/caption]
Imagens: Damien Jacob]]>